O século é XXI, mas continuamos a viver uma contradição silenciosa nas nossas famílias e na própria sociedade.
Levantar a mão contra mulheres ou idosos é, e bem, amplamente condenado. Há indignação, há campanhas, há leis.
Mas, quando se trata de bater numa criança, muitos ainda tentam justificar,dizendo que é “para educar” ou “eu apanhei e não morri”.
Mas será que bater educa? Será que a violência ensina? Ou será apenas o reflexo das nossas frustrações e da nossa dificuldade em lidar com os desafios da vida? A verdade é que, a chapada não vem de um lugar de amor ou de preocupação genuína, mas sim do cansaço, do stress, do descontrolo emocional dos pais.
A frustração, a pressão do trabalho, a falta de apoio tudo isso pesa. E quem acaba por levar com esse peso? As crianças. O problema não está nos nossos filhos.
Está em como nós, adultos, temos lidado (ou não) com os nossos próprios conflitos e emoções. Quantos de nós já não reconhecemos que, em certos momentos, em vez de educar, acabamos por transmitir os nossos medos, inseguranças e falta de equilíbrio interior?
Por isso, é fundamental começarmos a procurar outras formas de educar que não envolvam dor nem medo. Há métodos simples e eficazes que podem ajudar-nos a guiar os nossos filhos com amor e firmeza.O diálogo constante, por exemplo, é uma grande ferramenta. Conversar com a criança sobre os seus omportamentos, emoções e escolhas ensina-a a pensar, a sentir, a assumir responsabilidades.
Também é importante aplicar o reforço positivo quando valorizamos e elogiamos atitudes correctas, encorajamos a criança a continuar a agir de forma adequada. Educar não é só corrigir, é também reconhecer o que está bem.
Vivemos num tempo onde os bens materiais a casa bonita, o carro de sonho, as viagens, o ter e possuir são vistos como sinal de sucesso. Mas será que os nossos filhos precisam mesmo disso tudo? Claro que não há mal em querer dar o melhor.
O problema é quando confundimos “dar o melhor” com “dar coisas”. Os nossos filhos não querem só brinquedos, roupas ou tablets. Eles querem e precisam da nossapresença. Querem sentir-se vistos, ouvidos, amados, acolhidos e compreendidos.E presença verdadeira também passa por dar o exemplo.

As crianças aprendem muito mais com o que vêem do que com o que lhes dizemos. Se queremos que saibam respeitar, é preciso mostrar respeito no dia-a-dia. Além disso, estabelecer rotinas e limites claros dá segurança à criança. Ela sabe o que esperar e sente que há estrutura. Limites não são castigos são caminhos.
Não se trata de largar o trabalho ou esquecer os nossos objectivos e sonhos. Mas trata-se, sim, de saber estar verdadeiramente presentes quando estamos em casa.
Fechar um pouco o ecrã do telefone, deixar as redes sociais de lado, fazer uma pausa nas preocupações e simplesmente estar com eles. Ouvir, brincar, rir, juntos. Mostrar que, mesmo com as nossas malambas, estamos aí de corpo e alma.
Quando surgem comportamentos desafiantes, podemos aplicar consequências naturais e lógicas. Em vez de gritar ou bater, podemos mostrar que cada acção tem uma consequência. Se não guardou os brinquedos, pode não haver tempo para brincar no dia seguinte. Isso ensina mais do que qualquer chapada.
Também devemos investir na educação emocional ajudar a criança a dar nome ao que sente e encontrar formas de lidar com isso, como respirar fundo ou contar até 10. São ferramentas para a vida.Sim, sabemos que a vida está dura.
O custo de vida subiu, e muitos pais lutam diariamente para pôr comida na mesa. Muitos fazem dois ou três biscates, trabalham até tarde e ainda têm contas acumuladas.
Ninguém está a falar aqui de luxo. Estamos a falar de sobrevivência. E por isso mesmo é que precisamos de olhar para esta realidade com mais sensibilidade.
É urgente que se invista em políticas que apoiem as famílias. Precisamos de horários mais flexíveis, de apoio psicológico acessível, de programas de parentalidade que acolham e orientem sem julgar.E, acima de tudo, precisamos de espaço para pedir ajuda quando estamos no limite. Não temos de saber tudo.
Procurar apoio de psicólogos, terapeutas familiares ou participar em grupos de pais pode fazer toda a diferença. Não é sinal de fraqueza é um acto de amor e de responsabilidade.
A violência não é, nem nunca será, um caminho para educar. Ela é um grito de socorro, um sinal de que algo está mal em nós e no sistema que nos rodeia. Educar com amor, com firmeza e respeito é possível. E mais do que possível, é necessário.
Os nossos filhos merecem crescer com adultos que sejam guias, não agressores. Que saibam dizer “não” com carinho, que saibam corrigir com paciência, e que saibam pedir desculpas quando erram.Porque o maior legado que podemos deixar não são materiais, mas boas memórias.
A memória de um pai que soube abraçar mesmo cansado, de uma mãe que, mesmo exausta, ouviu com atenção, de um adulto que escolheu o caminho do amor, todos os dias.Filhos precisam de pais com o coração no lugar e não com a mão levantada.
Por: Elisângela Chissamba