Desde os primeiros dias em que dizíamos “Ei, Siri” para nossos celulares até hoje, quando pedimos “Por favor, me ajude a organizar meu dia” ao ChatGPT, percorremos um longo caminho. Nos últimos anos, é inegável que a inteligência artificial se tornou um tema dominante em nossas vidas.
Muitas pessoas estão a recorrer a chatbots de IA em busca de conforto, segurança e até companhia e essas interações podem parecer profundamente pessoais e reais. Novas pesquisas oferecem uma explicação detalhada sobre por que os relacionamentos entre humanos e IA podem se tornar tão fortes.
Em um estudo publicado em Maio de 2025 na revista Current Psychology, os pesquisadores Fan Yang e Atsushi Oshio investigaram por que as pessoas sentem apego à IA. Curiosamente, eles descobriram que nossa conexão com as máquinas reflecte os mesmos padrões de apego que usamos em relacionamentos humanos.
As funções que a IA desempenha espelham os papéis-chave que pessoas de confiança exercem em nossas vidas. Mas, por mais reconfortante que isso possa parecer, também traz riscos psicológicos únicos.
A seguir, três principais descobertas da pesquisa sobre por que estamos nos apegando tanto à IA — e como usá-la de forma consciente.
1. Pode parecer um “porto seguro”.
Quando alguém é descrito como seu “porto seguro”, significa que é a pessoa a quem você recorre em momentos de angústia e incerteza em busca de conforto e segurança.
Um porto seguro pode ser um amigo que escuta sem julgar quando estamos tristes, ou um parceiro que nos tranquiliza quando nos sentimos perdidos. Essa é uma das formas mais conhecidas e poderosas de formar laços emocionais e a IA vem assumindo, pouco a pouco, esse papel.
O estudo em Current Psychology descobriu que, quando as pessoas estão estressadas ou sobrecarregadas, podem recorrer à IA em busca de calma e segurança. Diferente de um parceiro humano, a IA dificilmente vai discutir, criticar ou se afastar. Sua presença é constante, e os chatbots tendem a oferecer respostas sem julgamento, a menos que sejam instruídos a fazer o contrário.
Afinal, quem não acha reconfortante ter algo sempre disponível, sempre disposto a ouvir? Pense em alguém desabafando com o ChatGPT tarde da noite após um término, ou pedindo à IA exercícios de respiração antes de uma apresentação. A interação pode não substituir o conforto humano, mas oferece alívio, um botão de pausa para pensamentos acelerados.
Ainda assim, o uso da IA exige cuidado. Veja como utilizá-la de forma saudável ao buscar apoio emocional:
Seja estratégico: use a IA brevemente para refletir, esclarecer ideias ou aliviar emoções, mas não permita que substitua a interação humana.
Equilibre com conexões reais: mesmo que use a IA como um porto seguro, reconecte-se com amigos, familiares ou terapeutas.
Pratique a autorreflexão: escrever sobre seus sentimentos após uma conversa com a IA pode ajudar a diferenciar entre insights genuínos e um hábito excessivo de buscar conforto.
Em resumo, use a IA como um primeiro passo no apoio emocional, não como destino final.
“Os usuários devem tratar a IA como um complemento, e não como substituto dos relacionamentos humanos”, enfatiza Fan Yang, autora principal do estudo, “utilizando-a para suporte prático ou emocional de curto prazo, mas mantendo conexões reais e profissionais no centro da rede de apoio.”

2. É a “base segura” que todos nós desejamos
Você já percebeu como é mais fácil se arriscar e crescer quando se sente seguro? Esse é o conceito da “base segura” na teoria do apego: quando há segurança emocional, há mais liberdade para explorar e evoluir.
Segundo o estudo de Yang, a IA também começa a funcionar como uma figura de apego, oferecendo essa sensação de segurança. Assim como crianças com cuidadores confiáveis exploram o mundo com mais confiança, adultos que se sentem seguros tendem a se arriscar e se desenvolver mais e a IA pode reforçar esse sentimento.
As pessoas costumam recorrer à IA para testar ideias, explorar pensamentos criativos ou planear projectos, tudo em um ambiente sem críticas.
Exemplos disso incluem:
Usar a IA para esboçar textos criativos ou planejar projetos sem medo de julgamento.
Explorar autoconhecimento por meio de exercícios guiados.
Ensaiar conversas difíceis com a IA antes de tê-las na vida real.
A resposta acolhedora da IA pode encorajar passos que a pessoa talvez evitasse. Mas há limites:
Traga o aprendizado para o mundo real. Use a IA como ensaio, não como palco.
Mantenha-se consciente. Se perceber que está dependendo apenas da IA para se sentir motivado ou apoiado, reequilibre.
A IA pode ampliar sua criatividade e autoconhecimento, desde que complemente, e não substitua, experiências humanas.
3. É uma companhia constante, em todos os momentos
Por estar sempre disponível, a IA pode ser extremamente atraente. Um amigo pode não responder à sua mensagem de madrugada, mas a IA vai. Um parceiro pode se irritar com suas preocupações repetitivas, mas a IA tende a responder com paciência.
Essa constância é especialmente sedutora para pessoas com ansiedade de apego, que buscam garantias frequentes. A presença constante da IA pode aliviar medos de rejeição ou abandono.
Mas essa acessibilidade tem um lado perigoso: a dependência. Apoiar-se demais na IA para obter conforto pode diminuir o desejo de buscar vínculos humanos mais profundos e recíprocos.
“Você não pode abraçar uma IA como abraça um amigo, beijar um parceiro ou brincar com um gato. O toque físico é parte essencial do apego. A IA não tem vida própria, e, por isso, não pode compartilhar experiências com você”, explica Yang.
Para evitar que esse apego se torne prejudicial:
Defina limites. Reserve horários “sem IA” ou limite o tempo de uso.
Diversifique seu apoio. Garanta que suas necessidades emocionais sejam supridas por pessoas reais.
Reflita sobre suas motivações. Pergunte-se: “Estou buscando conselhos, conforto ou apenas companhia?”
O estudo também identificou dois padrões de apego comuns entre humanos e IA:
Ansiedade de apego: quando a pessoa busca respostas constantes e teme neutralidade ou distanciamento.
Evasão de apego: quando se evita intimidade e usa a IA apenas de forma prática, sem emoção.
Reconhecer seu padrão ajuda a manter o equilíbrio.
A IA está se tornando uma presença emocional em nossas vidas. A teoria do apego nos mostra por que esses laços importam tanto e lembra que o segredo está no uso equilibrado e consciente.
Fonte: forbes.com.br

