• Lost Password?
  • Lost Password?

UMA REFLEXÃO PROFÉTICA E POÉTICA DAS IDENTIDADES DO HERÓI NACIONAL

Por: MONA KISOLA DYA NZAMBI

Há um murmúrio no ventre da terra onde nasceu Agostinho Neto, herói da nossa Nação. O lugar que já foi Bengo, um dia Luanda, hoje é Icolo e Bengo. São as fronteiras a moverem-se como sombras ao entardecer. É como se a própria terra, cansada de carregar o peso da sua história, se sacudisse, na troca de pele, na mudança de identidade. Mas o herói, ah, ele continua, constante e inabalável, mesmo que o chão onde nasceu insista em dançar ao som de novas nomenclaturas.

Mas será que a terra que viu nascer Agostinho Neto, que libertou a Nação, merece esse trato? Que valor tem a constância do nome diante da mutabilidade da terra? Se até ele, o grande Neto, “vê” a sua identidade moldada e remoldada ao capricho dos tempos, o que será de nós, Zé Povinhos, os “ninguéns” desse país? Já cantou o puto, que tem mais que kota Português: afinal a vida é assim… Tem bwe de coisa pra contar..!

Nem sei se nós, poeira anónima ao vento, merecemos tal fluidez, quando até o gigante Agostinho Neto, que colocou nessa terra uma esperança sagrada, não encontra estabilidade no registo da história.

E foi numa conversa reflexiva com o meu irmão, cuja sabedoria desenha mapas invisíveis e invencíveis da minha consciência, Atsoc Nortlad, que essa semente foi plantada na minha mente. Ele, com a sua sabedoria sagaz, me fez questionar se o herói merece essa dança de identidades e fronteiras, se ele, que deu tudo pela Nação, deveria também ver a sua origem ser desfeita, perdida no meio das novas divisões territoriais. Rimo-nos tanto, a ponto de fazer nascer um filho, um filho da ironia e da reflexão. Mas a pergunta, insiste em não querer calar: Se a resposta a essa questão  for positiva, como aceitar que nós, os que não carregamos peso maior que o da própria existência, tenhamos direito a uma identidade, uma umbigada, aquela terra que nos viu nascer?

Numa dessas noites de conversa, onde a reflexão virou riso, criamos algo mais do que pensamentos. Fizemos nascer um filho. Um rebento da ironia, da filosofia crua e do humor que desarma. A minha barriga, já emprestada a tantas ideias, virou terreno fértil, e a minha vagina, uma passagem para o novo. O filho que geramos não tem nome, porque ele é a própria dúvida que nos assombra, a mesma dúvida que o solo de Icolo e Bengo lança sobre o nome de Agostinho Neto.

Mas que filho é esse, senão um reflexo das nossas próprias incertezas? Um filho como se o próprio nome fosse uma prisão, uma limitação à nossa verdadeira essência. Ele é a própria dúvida, a personificação da mudança constante que nos cerca. E assim como o herói, nosso filho nasce num mundo onde as identidades são como roupas que trocamos ao amanhecer, onde o lugar onde nascemos pode não ser o mesmo lugar onde morremos.

E então, nesta introspecção sem fim, me pergunto se seremos, nós também, uma série de identidades trocadas ao sabor do vento. Se o lugar onde nascemos, o nome que carregamos, são realmente nossos ou apenas vestes que o tempo há de mudar.

Que nos conforte o facto de sabermos que, o herói troca de lugar, de nome, mas a sua essência permanece. 

E como mesmo sem nome fixo, somos parte dessa história, ainda que de forma invisível, mesmo que a nossa identidade seja, no fim, apenas um eco na memória de quem por nós passou.

E nós? Somos levados pela maré da história, ora como risos, ora como lágrimas, mas sempre à mercê de um destino que não podemos controlar. E no final, o que importa não é o nome que carregamos, mas a marca que deixamos, mesmo que seja apenas um sussurro no eco do tempo.

A algum lugar, sempre havemos de chegar… E porque somos mais profetas do que poetas, de certeza, havemos de voltar!

Escrito Por
Redacção
View all articles
Deixe aqui seu comentário